sábado, janeiro 27, 2007

A passagem dos medos




Sempre tinha sabido da existência daquela passagem. Escura, ameaçadora, concentrando todos os medos. Tinha a certeza de que a vida a levaria por aquele caminho algumas vezes e que a travessia não seria fácil. Tactear, cair, procurar apoio, levantar. Era quase um guia para atravessar a passagem.
Na infância, visualizou fisicamente essa passagem, na velha casa. Era aquele corredor enorme que atravessava a casa de uma zona de claridade a outra zona de claridade. Um corredor escuro, escuro. E o quarto dela ficava no meio. Talvez tenha sido nessa época que aprendeu a atravessar a passagem dos medos.
Hoje encontra-se menos vezes nesse lugar escuro. Ou talvez tenha apenas aprendido a atravessá-lo, com a certeza de que alguma luz existirá do outro lado.




(Esta semana, no Palavra puxa palavra, a palavra era "MEDO")

16 comentários:

maria josé quintela disse...

Segue o teu medo, disse Rainer Maria Rilke.

Concordo. Não o perder de vista não o elimina, mas ajuda-nos a compreendê-lo!

bj

M. disse...

Este "corredor escuro, escuro" de que aqui falas lembrou-me o corredor de casa dos meus pais por onde eu passava a correr desde o meu quarto até à porta de entrada na outra ponta. Tinha pavor e nem queria olhar para trás com medo, nem sei bem de quê. Era uma sensação horrível.

bettips disse...

Ah...como somos corajosas, as pequenitas. Todas tivemos um corredor, uma passagem iniciática. Hoje que tanto sabemos ser racionais, os medos apanham-nos como ratoeiras inesperadas. Com pessoas. Com notícias. Bjinho

lésbica só disse...

passagem, medo...
Belos textos e fotos. Gosto muito de ler:)
Bjs

croqui disse...

haverá sempre uma luz do outro lado que nos espera... díficil é encontrar a luz que há deste lado!

belo texto!

JPD disse...

Para resolver o labirinto, os gregos acharam suficiente estender um cordel ou uma corda. Não vencido o perigo, recuar-se-ia. Porém, como vencer a angústia?
:)
(«O Inverno» é extraordinário. :))
:)

osangue / PR disse...

Gostei, mesmo. Boa noite.

A. Pinto Correia disse...

Os escuros estão lá. Ela aprendeu apenas a lidar com os medos.
Gostei deste texto de sombras.
Beijo

Anónimo disse...

Medos..nunca os tive (nem na guerra) pelo contrário..

Mas..timidez, é medo? :-)

Um dia, ao entrar em casa, e ao fechar a porta sabendo que já não tenho lá ninguém..terei medo?

Para mim nada mas mesmo nada, tem fim..mas tudo tem começo..aprendizagem..determinação..

um abraço
intruso

as velas ardem ate ao fim disse...

Gostava de já ter conseguido ultrapassar os meus.já era tempo...

bjinhos

Liberdade Joaninha disse...

Boa noite

criamos este blog para quem quiser participar. Com o que quer se seja.
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Nina Owls disse...

medo é não atravessar e ficar sem saber o que há do outro lado. medo de não viver o suficiente, medo de perder o comboio do amor, imersos em ilusões...que medo de acordar e a vida estar já gasta! Tal como o anónimo, o meu medo não é do escuro mas do que tem luz e não se revela. Medo de parar.
Esse teu corredor, por mais manuais, apresenta sempre um medo recem-chegado, renascido do dia novo. Ter medo é viver, com cautela. E o Leonard Cohen a encaminhar o teu medo, melhor que qualquer manual de instruções Alice. Agora espreitar o medo do puxa a palavra. Hasta rasta

João JR disse...

Coragem é a arte do medo sem que ninguém perceba...
aprendi isto ainda era uma "criança":)
Belo post este teu!
Um beijo grande Vida,

Narcisa disse...

Gostei desta pequena prosa mas tenho de te dar os parabéns pelo título do teu blog, é lindissímo :)

Um Beijo

miruii disse...

Medo dessa paisagem louca, linda?

Diafragma disse...

E quem não teve um corredor destes.
O meu ficava num pequeno quintal, sem iluminação, e onde o meu avô me fazia ir buscar qualquer coisa bem lá ao fundo no fim de jantar, enquanto ficava na janela iluminada como um farol quando olhasse para trás.