terça-feira, agosto 28, 2007

página em branco

esta página fica em branco. porque quero. ou porque é preciso. branco de não haver futuro. de não saber se há. nem negro de trevas. nem cinza de indefinição. margens brancas de tempo esquecido. linhas brancas de palavras apagadas. sigo em frente. sem tempo de voltar. um dia talvez seja possível. escrever nas linhas brancas, digo. se as letras se juntarem. se encontrarem o seu caminho para refazer o poema.


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Faço aqui um intervalo. Sem prazo para voltar. Talvez as letras encontrem o caminho... Obrigada a todos os que por cá passam.

sábado, agosto 25, 2007

Como uma ilha...




Banhas-me assim
Em ondas de amor morno
Passadas que são as marés vivas
E as tempestades da paixão
Um dia dirás de mim ter sido ilha
Fechada entre as brumas e o mar
Guardando segredos quietos
Caladas crateras de alma
Que só conseguiste espreitar
Porque as ilhas vivem dentro delas
E ao mar entregam toda a solidão
Banham-se nas ondas de amor terno
Morno
Na praia esperam a volta da maré.


Foto: S. Miguel, Açores, miradouro de Sta Iria

quarta-feira, agosto 22, 2007

The dark side of the moon




Certo. Todas as coisas têm dois lados. Ou vários. Desde os objectos às pessoas. Seria monótono, dizem. Lados iguais. Ou somente coerentes. Apagaria as boas e as más surpresas. Vejam a lua. Tão bela no seu lado visível. A magia do luar. Poética. Não pensamos no lado oculto. Uma surpresa. Ganham-se as diferenças num jogo de luz e sombra. E as angústias de espreitar o lado negro. Diz-me. Vê-se novamente o luar? Depois de ter ido até ao dark side?




Foto by Nuno Milheiro

sábado, agosto 18, 2007

Compasso de espera




Passam no espaço
os passos de alguém
que não deixam traço
da espera sem fim.
Compasso de espera
sem espaço em mim.
E quando os passos
não forem quimera
será que os seus ecos
dão sentido à espera?

Março 2005

quarta-feira, agosto 15, 2007

Palavras presas




As palavras presas. Nem um som as articula. Conversas cruzadas iguais. Cansaço das tardes. Sobretudo das tardes. E tudo o que já não será dito. O tempo que foge. As horas que se arrastam. Os corredores vazios. A inquietação. Nenhum dia se repete. Nenhuma palavra será recuperada. Liberta. Outras serão ditas. Diferentes. Nenhuma palavra é igual. Cada uma se perde com o olhar que a diria.

domingo, agosto 12, 2007

A casa escondida




E havia aquela casa escondida. Um mundo de mistérios e interrogações. Um labirinto não visível a quem passava ao longe. Só perto. Muito perto. Com os anos a casa tinha-se misturado com o meio. Abraçava as árvores e o mato que a rodeavam. Deixava entrar o sol que nunca a desvendava por inteiro mas lhe iluminava os dias. Só ele a tornava visível. Parcialmente. No interior a sombra aninhava os segredos por conhecer. Quem se aproximava julgava vê-la. Uma casa sem nada de especial. Não sabiam o seu interior. Escondido.

quarta-feira, agosto 08, 2007

Verde azul




não sou o meu sonho. verde azul. da cor dos olhos dos pastores que tocam flauta. e das princesas que choram. não entram na minha história reis tiranos. nem belas encostas de prados verdes. ou vales profundos onde as lágrimas caem. na terra que piso não brotam flores azuis rosa brancas. nem a água ferve. no desvendar de mistérios inquietantes. e as gentes não se sentam a olhar o mar. durante horas. como se lhes escutasse os segredos. sou de terras castanho verde prosaico. de uma paleta limitada. onde as lendas são de castelos e mouros. e heróis da cristandade. terras de gente de outras cores. olhei o meu sonho. nos olhos tinha água verde azul. encontrei a inquietação da beleza perfeita. a angústia de não poder lançar o voo sobre a paisagem. a impossibilidade de a guardar. em mim. verde azul.




Foto: S. Miguel, Açores, Lagoa das Sete Cidades

domingo, agosto 05, 2007

amanhecer




lembras-te daquele fio invisível que nos ligava nas horas de solidão? eu julgava saber de ti e tu de mim como se a distância fosse só uma metáfora. e o caminho para encontrar o outro estivesse ao alcance de um fechar de olhos. para ver por dentro. era então o fio que nos unia para lá de toda a saudade. amanheci no escuro da noite. dizia-me o pesadelo que o fio se tinha partido. e eu às voltas. tonta. de não encontrar o caminho para ti. e era escuro. como se todas as luzes estivessem escondidas na bruma. talvez tenha arranhado o corpo. as mãos. não sei. a alma. em vão. a luta. as brumas. o sal molhado. acordei do pesadelo quando fechei os olhos. para ver por dentro. o fio estava suspenso. mas firme. vi-te.

quarta-feira, agosto 01, 2007

Os deuses da ilha




A ilha acorda-nos estendendo o braço de luz velada pela janela do quarto. Há sempre o canto dum pássaro louvando o sol ou um simples piar melancólico por entre a neblina. Os deuses da ilha são caprichosos. Choram e riem com a mesma facilidade, tornando os dias imprevisíveis. Irão desvendar os tesouros ocultos no corpo da terra ou escondê-los-ão na bruma? Não sabemos. Só podemos estar atentos aos sinais e aproveitar a sua boa disposição para subir o mais alto possível e ver… Tentar assimilar a beleza, tão intensa que chega a doer. Nesta viagem de emoções, o olhar que mais importa é o da alma. É com ela que vemos vales, montes, lagoas e o mar, o mar, o mar… É com ela que sentimos a morna humidade que nos envolve o corpo, caminhamos sobre as pedras negras vindas das profundezas escaldantes da terra e acabamos por adormecer de cansaço físico e emocional, escutando se o vento sopra no início da noite. Como se a ilha nos dissesse que nos espera no dia seguinte, com bruma ou claridade, com chuva ou sol. Até à despedida, que, queiram os deuses, será sempre até breve.



Foto: S. Miguel, Açores, algures no caminho...