quinta-feira, setembro 29, 2011

Outono sem chuva



É Outono. E ainda não chove. Tenho esta imitação de folha em branco e os dedos tropeçam no teclado. De quem falo? Como querias ser lembrado? O dourado dos caracóis da criança, as impertinências do adolescente espigado, o homem, o pai, o artista... Haverá muitas coisas de ti que não conheci. Mas, agora que aqui não estás e já não te posso perguntar, não consigo que os meus dedos encontrem as palavras que te descrevem. Só inquietação. Minha, tua. Levaste contigo a paz que se encontra nas memórias de infância, nos risos antigos que ficam a ecoar nas casas. Ficaram as perguntas, os silêncios, os vazios que não serão preenchidos.

Inquietação. Estás em frente à janela, tenho a certeza. É Outono. E a chuva ainda não bateu nos vidros.

sexta-feira, setembro 23, 2011

Entre o sonho e a realidade



Sentado no carro olho as luzes da cidade espalhadas pelas gotas de água que escorrem nos vidros.
Ligo o aquecimento, procuro uma estação de rádio. Música melancólica. Oceano Pacífico. Apropriado.
A noite vai ser longa e o dia foi cansativo.
"As noites longas do Oceano Pacífico".Dizem.
A música, o ruído de fundo da chuva e o cansaço levam-me para um espaço entre o sonho e a realidade.
Nele quero estar.
É nele que tu existes. Entre o sonho e a realidade.
Desde sempre foi aí que te encontrei.
Nele crescemos juntos, brincámos, nele nos amamos, nele vivemos como criaturas de luz que somos.
Sabemos que o tempo é curto. Apenas existe naqueles minutos entre a realidade e o sonho.
Sei que estás, como eu, nos outros espaços.
Mas neles não nos (re)conhecemos.
E ansiamos esse pequeno espaço de tempo em que, de facto, estamos vivos.
O tempo começa a esgotar-se. Luto contra o sono, luto contra o despertar.
Não quero a separação.
O barulho de pancadas fortes e um coro de buzinas sobressaltam-me:
Acorde, gritam-me de fora do carro, o sinal está verde, porra !
Você está a empatar o trânsito!

foto e texto de Dionísio Leitão


[adeus, meu irmão. a tua viagem na realidade terminou. resta agora a que sonhaste e em que esperamos encontrar-nos todos, um dia. ]


sábado, setembro 17, 2011

Endless Night


"Some are born to Sweet Delight, Others are born to Endless Night"

William Blake

quarta-feira, setembro 07, 2011

Bagagem

foto: luggage by Dariusz Klimczak



Nada existe para além de mim
Na angústia ambivalente das tardes
O pôr do sol é só cenário antigo
Um pó dourado sobre a realidade
Desvio os olhos do longo prado azul
Que a verdade revela manchado de lama
Não quero nada para além de mim
Prenhe que sou de perdidas ilusões
Só o terreno arrepio das manhãs
E o vento inquieto em cada fim de tarde