sexta-feira, janeiro 20, 2012

sons de um dia




Filomena ouvia o som daquele dia. Extravagante, talvez, aquela mania de ouvir cada dia de forma diferente. Não exactamente música, por vezes só ruído, murmúrio ou grito estridente. Aquele era um dia de sussurros que saíam dos cantos das paredes. Entravam nela como portadores de paz, misturados com suaves raios de sol. Deu-se a esse conforto sem reservas e deixou fugir os ruídos traumatizantes de dias anteriores. Lá viria o tempo em que voltariam. Filomena já tinha vivido dias suficientes para saber que nem o conforto interior nem a angústia duram sempre. Os sons dos seus dias poderiam ser já uma sinfonia que ainda não conseguira compor. Faltava-lhe a transição harmónica necessária para transformar ruídos desconexos em música fluente. Sobretudo, subsistiria sempre nela a dúvida de conseguir sentir a vida dessa forma. Que importava isso, afinal? Aquele era um dia de reconfortante suavidade. Por agora, era suficiente.